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ማክሰኞ 8 ማርች 2022

DIA INTERNACIONAL DA MULHER 2022: Dona Ana Paes senhora do Engenho Casa Forte

É com grande satisfação que trazemos a história de vida de uma mulher do século XVII, Dona Ana Paes. Exemplo de empreendedorismo, bravura e coragem quebrando as regras de submissão às mulheres ao mundo luso-brasileiro.

Ana Paes Gonsalves de Azevedo nasceu em 1617. Os pais Jerônimo Paes de Azevedo e Isabel Gonsalves Paes tinham muitas posses e concedeu uma educação primorosa à Ana que além da leitura, falava e escrevia em latim, aprendeu a lidar com os fornecedores de cana, feitores, escravos, comerciantes etc. Posteriormente aprendeu o idioma alemão.

Ana Paes recebeu o engenho que fora batizado originalmente de Casa Forte, o maior da Várzea do Capibaribe, como dote nupcial ao casar-se com o fidalgo português Pedro Correia da Silva. Pedro faleceu precocemente em 1635, lutando contra a invasão holandesa a Pernambuco.

Nesse momento, Ana Paes mostra seu lado de bravura e empreendedorismo. Ao contrário da maioria das famílias de posses que nesse período de conflitos migram para a Bahia, Ana permanece viúva na propriedade. Como senhora de engenho Ana conhece e casa-se no ano de 1637 com o Capitão Carlos de Toulon, oficial do exército inimigo. Por razões óbvias esse fato escandalizou a sociedade da época, acrescido do fato de serem os invasores considerados hereges pela igreja católica e a conversão de  Ana ao calvinismo.

Acusado de conspirar contra o governo holandês, Toulon é deportado para Amsterdã por ordens de Nassau. Ao chagar na Europa Toulon vem a falecer.

Ana Paes mais uma vês surpreende ao casar-se novamente com outro oficial da infantaria holandesa: Gilbert de With. O casamento ocorre em uma extensa área do engenho chamada de Campina de Casa Forte, hoje Praça de Casa Forte.

O engenho sofreu várias alterações de nome chamou-se Toulon, Nassau e por último Engenho de With. Voltando a chamar-se Casa Forte após a Restauração Portuguesa.

Ocorre que o Engenho de Casa Forte é tomado pelos flamengos em 3 de agosto de 1645 e nele encarceradas como reféns várias mulheres de chefes revolucionários pernambucanos. Esse fato propiciou uma das batalhas mais importantes e sangrentas travadas entre lusos brasileiros e holandeses no dia 17 de agosto. Os lusos saíram vitoriosos.

Vemos que estamos diante de fatos de extrema relevância para a formação do Brasil como nação e um lugar de muita importância histórica. Em seu livro “Arredores do Recife” o historiador Pereira da Costa afirma que o local era uma das melhores propriedades agrícolas de Pernambuco “pela sua vantajosa situação, com matas, terras, vales férteis e facilidade de comunicação fluvial com a Praça do Recife. Ao seu lado a capela belamente construída”.

Com a capitulação holandesa Ana foi considerada da mesma nacionalidade que o marido e partiu com ele para a Holanda local que faleceu em 1674 em Dondrecht onde morava.

Com a partida de Ana Paes o engenho passa a ser administrado por seu sobrinho João de Freitas da Silva, filho de sua irmã D. Jerônima Paes de Azevedo.

O legado de Ana Paes vai para além dos remanescentes do seu engenho, bairro de Casa Forte e a Avenida 17 de agosto. Fica o exemplo de alguém que soube conquistar um lugar na sociedade como mulher, mãe e administradora em distante época.  

A capela tornou-se a Matriz de Casa Forte (1911) e no local da casa grande, adquirida em 1907 e reformada foi instalado o Colégio da Sagrada Família. A área relativa a Campina de Casa Forte como já foi dito hoje Praça de Casa Forte que foi o primeiro jardim público projetado pelo paisagista Roberto Burle Marx em 1935.

Matriz de Casa Forte

Os tanques da Praça de Casa Forte
Pintura de André Nóbrega.

 
IPHAN inicia processo de tombamento de jardins de Burle Marx no Recife.

A decisão do tombamento foi do Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, que se reuniu em Brasília. O pedido foi realizado pelo Laboratório da Paisagem da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), em 2008, com o apoio da Associação Brasileira de Arquitetos Paisagistas (ABAP) e do Committee on Historical Gardens and Cultural Landscapes, organismo britânico que presta consultoria para a Unesco.

Armando Farias

 

DANTAS, Rafael. A batalha que se fez barro. Publicado em 15 de setembro, 2015. https://revista.algomais.com/a-batalha-que-se-fez-barro/. Acesso em: 07 Mar. 2022.

DIÁRIO DE PERNAMBUCO (Blog). Ana Paes, uma mulher à frente do seu tempo. Disponível em: Ana Paes, uma mulher à frente do seu tempo | Pernambuco, História & Personagens (diariodepernambuco.com.br). Acesso em: 07 Mar. 2022.

G1 PE. Iphan inicia processo de tombamento dos Jardins de Burle Marx no Recife. 22/11/2014 Disponível em: G1 - Iphan inicia processo de tombamento dos Jardins de Burle Marx no Recife - notícias em Pernambuco (globo.com). Acesso em: 07 Mar. 2022.

JORNAL DO COMÉRCIO. Dona Ana Paes senhora do Engenho Casa Forte – Uma mulher a frente do seu tempo. Recife, 18 de fevereiro de 1999. p. 2.

RODRIGUES, Maria de Lourdes Neves Baptista. Engenhos de Pernambuco. Casa Forte/Recife - Casa Forte. 03/11/2014. Disponível em: http://engenhosdepernambuco.blogspot.com/2014/11/engenhode-jeronimo-paes-de-gonsalves.html. Acesso em: 07 Mar. 2022.

ዓርብ 28 ጃንዋሪ 2022

PATRIMONIO HISTÓRICO DO CEARÁ

Hoje, 28 de janeiro, se comemora o dia da fundação do Instituto Arqueológico Histórico e Geográfico de Pernambuco (160 anos). Exemplar instituição com alto grau de visibilidade que poderia ser “copiada” em sua expertise pelo nosso empedernido e escondido Instituto Histórico Cearense. 

Fotos do interior do Instituto Arqueológico Histórico e Geográfico de Pernambuco
Acervo particular

O Ceará deveria, a exemplo de Pernambuco, dar maior destaque e acesso às instituições que abrigam e constituem em si elementos pertinentes ao nosso patrimônio histórico. Já vai longe a ideia de que o Instituto era do Barão de Studart. É do povo cearense e a ele tem que se voltar.

É praticamente impossível o cidadão conhecer o seu interior, inviolável e inexpugnável. Na mais favorável das hipóteses, até se consegue transpor suas “muralhas”, porém o pesquisador é induzido a uma edícula no fundo do lote, onde com muita sorte é recepcionado em um balcão, quase que nos jardins do prédio, e assim constrangido, tentar efetuar sua pesquisa. Fisicamente não consegue. O atendente promete enviar-lhe seu conteúdo via e-mail. Isso bem antes da pandemia. Hoje se encontra fechado. 

A ideia é copiar o que há de bom. O congênere pernambucano dispõe de um excelente espaço museológico aberto à visitação, democrático, fora a parte de pesquisas, também de fácil acesso. 

O fomento às tradições, à intimidade com nosso passado e o contato físico com esses aspectos que remanesceram só trarão fortalecimento à temática da conservação patrimonial, que não se faz apenas em gabinetes, faz-se com o conhecimento e engajamento da população. Alheia a esses elementos, o cidadão leigo não o valorizará, e por vezes até será um agente destruidor do mesmo, simplesmente por não compreender o significado da palavra PATRIMÔNIO.

Armando Farias

ቅዳሜ 29 ሜይ 2021

OUTROS HERÓIS DA ABOLIÇÃO: JOSÉ MARIANO E OLEGÁRIA

Muitas pessoas que foram engajadas na luta para a abolição da escravatura são pouco reverenciadas. Vários motivos levam a esse “esquecimento” em detrimento aos considerados ícones como Joaquim Nabuco, José do Patrocínio, Rui Barbosa e outros.

José Mariano Carneiro da Cunha e sua esposa Dona Olegária da Costa Gama foram pernambucanos ferrenhos defensores da liberdade dos escravos, chegando ao ponto de esconderem em sua residência escravos fugitivos para dar-lhes fuga, geralmente em uma barcaça coberta por feno descendo pelo Capibaribe até atingir o porto do Recife.
 
José Mariano Carneiro da Cunha Olegária da Costa Gama
José Mariano Carneiro da Cunha e Olegária da Costa Gama
Gouvea (1988, p. 150 e 158)

Dona Olegária chegou a assumir tarefas do marido quando este esteve preso inclusive vendendo joias de família para adquirir cartas de alforria de escravos, carinhosamente chamada de Olegarinha, ficou conhecida como “a mãe dos escravos” e “a mãe dos pobres”.

Também na casa de José Mariano localizada no Poço da Panela, por algumas vezes, abrigou a sede itinerante do Clube do Cupim, agremiação de inspiração carbonária que não tinha estatutos, sendo seu único fim a libertação dos escravos por todos os meios.

Residência de José Mariano no bairro Poço da Panela, em Recide-PE
O POÇO DA PANELA
Desenho de Mário Túlio. A esquerda, o antigo sobrado de José Mariano.
 Gouvea (1988, p. 136)

José Mariano além de abolicionista foi político, jornalista, bacharel em direito, deputado geral, deputado provincial e vereador da cidade do Recife. Recebeu muitas homenagens entre elas a nomeação da Câmara dos Vereadores do Recife, que a partir de 1940 passou a se chamar de Casa de José Mariano.

Armando Farias

SILVA, Leonardo Dantas. A Abolição em Pernambuco. Recife: Fundação Joaquim Nabuco, 1988.

ረቡዕ 10 ፌብሩዋሪ 2021

OS HOLANDESES NO NORDESTE E AS CONSEQUÊNCIAS PARA O BRASIL

O açúcar, e não a esperança de encontrar minas foi a motivação ao ataque a Pernambuco, que como as demais colônias portuguesas se encontrava à época sob o domínio da Espanha, em guerra com a Holanda, que refinava todo o açúcar produzido no Brasil

Desde a formação da Companhia das Índias Ocidentais (1621), passando pela invasão em Salvador (1624/1625), Pernambuco (1630) e a Guerra da Restauração (1645/1654), vê-se um dos capítulos mais importantes e ricos em acervo documental da historiografia brasileira na primeira metade do século XVII.

Há relatos documentais a partir de 1623 que vinham sendo reunidos na Holanda sobre dados e informações sobre a Capitania de Pernambuco. São depoimentos de vários navegantes holandeses, índios levados por Boudewyn Hendriksz para a Holanda e na colaboração de judeus comerciantes que moravam em Pernambuco na remessa de informações para a Holanda. Grande também é a documentação produzida pelos holandeses durante os 24 anos de dominação do Brasil Holandês. Essa produção continuou ocorrendo no editorial europeu mesmo após o fim da ocupação dos Países Baixos no Brasil.

A produção historiográfica brasileira no tema é razoável. Esse conteúdo é regularmente exposto e prestigiado apenas em Pernambuco, ficando os demais estados do Nordeste que pertenceram aos domínios dos Países Baixos distantes desses fatos. Em nível nacional é insignificante a importância dada pela historiografia (IHGB). Facilmente constata-se nos livros didáticos que apenas superficialmente expõe o conteúdo sobre o domínio holandês. Da mesma forma a imprensa de forma geral procede.

Para além do acervo documental, o que de mais importante se pode ressaltar como consequência positiva para o Brasil do período Holandês no Nordeste:

  • a fundação da cidade do Recife;
  • o embrião de Fortaleza;
  • o sentimento do nativismo. (Os primórdios da formação do conceito de identidade de povo brasileiro);
  • destaca-se a formação de exercito brasileiro.

A FUNDAÇÃO DA CIDADE DO RECIFE

Até a chegada de Nassau a Pernambuco (1637), na povoação do arrecife era apenas o porto e suas instalações, assentadas no estreito istmo, que com a chegada da Companhia das Índias (1630) passou a abrigar um continente habitacional maior que a capacidade dos imóveis oferecia. A capital da capitania era Olinda.

Nassau assume o comando do Brasil Holandês com o cargo de governador geral. Aporta no Recife em 23 de janeiro de 1637 e trás em sua comitiva soldados e a primeira missão científica a cruzar a linha do equador, fato que propiciou “o mais completo levantamento artístico, paisagístico, cartográfico e científico desta parte do Novo Mundo no século XVII”. (DP, 2003, D2)

Para sanar o problema habitacional Nassau viabiliza projetos arquitetônicos para a construção, urbanização e ocupação da Ilha de Antônio Vaz que seria a Cidade Maurícia, oficializada em 17 de dezembro de 1639. As construções mais vultosas foram o Palácio de Friburgo ou Palácio das Torres, a Casa da Boa Vista e a construção de três pontes, as primeiras de grandes dimensões do Brasil. Tantas outras obras ainda nos dias atuais podem ser identificados seus vestígios. Acabava de nascer O RECIFE.

Estátua em meio corpo do conde alemão João Maurício de Nassau-Siegen
Estátua em meio corpo do conde alemão João Maurício de Nassau-Siegen (1604-1679), governador do Brasil Holandês (1637–1644), situada na praça da República, em Recife (PE), em frente ao Palácio do Governo, inaugurada em 17 de junho de 2004, por ocasião do quarto centenário de seu nascimento 1604-1679. O monumento em bronze foi doação da República Federal da Alemanha ao povo de Pernambuco. Trata-se de réplica da escultura original, produzida por Bartholomeu Eggers (c.1630-1692) no ano de 1664, e que atualmente se encontra sob o túmulo de João Maurício de Nassau na cidade alemã de Siegen. 
Foto do acervo particular

O EMBRIÃO DE FORTALEZA

Com a implantação do primeiro Fortim de São Tiago na Barra do Rio Ceará por Pero Coelho de Sousa e sua continuidade em 1612 sob o comando de Martin Soares Moreno, redenominado Forte de São Sebastião existiu a vontade do colonizador português em criar um núcleo civilizatório na Capitania do Siará Grande até então despovoada do elemento europeu. Com a saída de Moreno em 1631 outras autoridades portuguesas assumiram a titularidade do São Sebastião.

Em outubro de 1637 cai a frágil fortificação na mão dos batavos sob o comando do major Joris Garstman e do Capitão Hendrick Huss que receberam ajuda estratégia dos indígenas Potiguaras chefiados pelo Cacique Algodão e Koigava. Esse continente militar holandês permaneceu no Forte de São Sebastião, consta em documentação pertinente que reformaram, ampliaram e municiaram o reduto passando a chama-lo de Forte do Siará (Arx in Siará).

Os objetivos da ocupação era manter um entreposto entre o Rio Grande do Norte e o Maranhão, capitania ambicionada pelos batavos. Havia também a extração do sal, que tinha elevado valor no mercado europeu, e o extrativismo e exportação do algodão, pau violeta e âmbar-grils. Durante o comando de Gedeon Morris de Jonge revelou-se ele um apaixonado pelas terras cearenses e como tal tentou promover seu desenvolvimento. Explorou áreas de salinas desde o Camocim até Mossoró, região que por muito tempo pertenceu a Capitania do Siará. Gedeon também introduziu o cultivo de vários vegetais nos arredores da fortificação. Fontes da época e historiadores modernos referem-se a Gedeon como ‘aventureiro” ou homem dotado de “muitas qualidades”. Era natural da Zelândia – Holanda. Na sua documentação pessoal percebe-se que passou cerca de oito anos prisioneiro nas terras do Maranhão (1628/1636), período que aprendeu a falar o português e a linguagem indígena.

O ambicioso projeto de desenvolver a exploração das salinas e exportação do sal fracassou diante dos poucos recursos disponibilizados pela Companhia WIC e pela malograda conquista do Maranhão (1641/1643) que ocasionou muitas dívidas e baixas no contingente de soldados e indígenas aliados. Em janeiro de 1644 Gedeon e toda guarnição neerlandesa do Siará foram trucidados por índios revoltosos, que depois se descobriu terem agido com terrível brutalidade.

Até o final da primeira incursão holandesa na Capitania do Siará Grande temos um insistente conceito por parte do colonizador de fixar-se na Barra do Rio Ceará, que por várias razões se mostrava para a época um inapropriado local para implantação de um futuro aglomerado urbano. Voltou a Capitania do Siará Grande a relativo abandono.

Em 1645 voltaram os batavos ao Siará em breve missão comandada por Roeloff Baro. Somente em 1649 é que a WIC envia Matias Beck ao Siará com o objetivo de localizar e explorar suposta mina de prata. A expedição partiu para o Siará em 20 de março, chegando ao Mucuripe a 3 de abril. Matias Beck rapidamente concluiu que a localização da antiga fortificação era inadequada. A água do Rio Ceará salobra, a barra assoreada e a distancia do “porto” eram fatores que o levaram a escolher as margens do Rivierbeken Genaalmd Marajaitiba (Riacho Pajeú) e do Bergh Marajaitiba (Morro do Pajeú) para instalar seu novo forte, denominado Schonenborch. Beck reforça sua escolha relatando em cartas aos superiores o cuidado com a defesa e que desde as encostas do morro do forte até as serras existiam grandes bosques e um grande estoque de madeira in natura. O fracasso das minas de prata relatadas pelos índios levou Beck a aproveitar os diversos recursos naturais e humanos da região propiciando a construção de um posto colonial. Acreditando no sucesso de sua empresa Beck chegou a escrever para Pernambuco solicitando a vinda de sua esposa. Não há comprovação se de fato ela veio.

Matias Beck aceitou a capitulação dos neerlandeses a 1 de maio de 1654, passando a administração da Capitania do Siará Grande ao português Álvaro de Azevedo Barreto. Sem saber do seu grande feito havia deixado como legado o embrião da futura cidade de Fortaleza.

Forte Schonenborch
Forte Schoonenborch, Riacho Pajeú e o Morro Marajataiba - 
detalhe do mapa: 't Forte Schoonenborch - Capitania de Siara
Amorim (2014, p. 69)


O Sentimento do Nativismo. (Os primórdios da formação do conceito de identidade de povo brasileiro).

Durante os primeiros anos que os holandeses estiveram no Nordeste do Brasil existiam capitanias autônomas, a despeito de haver um governo central não havia uma unidade como nação. Uma referencia anterior, análoga a esse movimento foi a participação do olindense Jerônimo de Albuquerque deslocado para o Maranhão para debelar os franceses, convocado na qualidade de militar. Martim Soares Moreno atuou como seu comandado. Não houve o engajamento de civis até porque a população de São Luiz era diminuta.

Um sentimento de nação começa a despertar em Pernambuco durante o período chamado de Guerra da Resistência (1630/1635). O general Matias de Albuquerque acompanhado de centenas de “pernambucanos” fundou a improvisada fortificação do Arraial do Bom Jesus (hoje Bairro de Casa Amarela) resistindo bravamente por cinco anos aos poderosos exércitos holandeses.

“Ao Arraial do Bom Jesus compareceram com seus comandados Luiz Barbalho e Martins Soares Moreno, Filipe Camarão com seus índios e Henrique Dias com seus negros, resolutos em manter uma guerra diuturna que veio a incutir na gente de Pernambuco o sentimento do nativismo”. (DP, 2003, D2) Diante de tremendos padecimentos, rendeu-se o Arraial sob o comando do Governador André Marim e seus capitães em 6 de junho de 1635.

Destaca-se a Formação do Exercito Brasileiro.

Passados dez anos da rendição do Arraial do Bom Jesus, voltam os pernambucanos a perseguir o ideal libertário. Liderados por João Fernandes Vieira e André Vidal de Negreiros teve adesão de senhores de engenho, entre eles Antônio Cavalcanti e o Capitão Antonio Dias Cardoso, veterano em técnicas de guerrilha, e da população civil em geral. Eclodiu o movimento chamado Insurreição Pernambucana, mais precisamente no dia 13 de junho de 1645, no engenho São João da Várzea. A senha era a palavra açúcar. O movimento objetivava o fim do Brasil Holandês, consequentemente restituir a coroa portuguesa das capitanias do norte.

“Foi a Guerra da Liberdade Divina, como fora definida a Insurreição Pernambucana, eclodida em 1645, um movimento surgido a revelia da Coroa Portuguesa, da parte dos moradores de Pernambuco, destinado a expulsão dos holandeses do território compreendido entre o Rio São Francisco e a capitania do Maranhão”. (SILVA, p. 26)

“Antes dos Guararapes, os nascidos no Brasil mesmo quando filhos de portugueses eram simplesmente chamados de mazombos. O gentílico brasileiro, do qual tanto nos orgulhamos, é fruto desses nossos ancestrais que, a custa do seu sangue de suas vidas e suas fazendas, lançaram as sementes da nossa nacionalidade”. (SILVA, p. 26)

“Foi no calor da “guerra brasílica”, assim chamada para denominar a ampla utilização dos métodos e táticas de guerrilhas até então desconhecidos dos exércitos europeus que pela primeira vês mazombos e reinóis, índios brasilianos, negros de nação, crioulos e mulatos, formaram os seus terços e juntos lutaram pela restauração desta terra”. (SILVA, p. 26)

Em 1645 Fernandes Vieira da início a obras do novo forte denominado Forte Real do Bom Jesus. Em 7 de outubro d 1645 João Fernandes Vieira é aclamado “Governador da Liberdade”. No documento firmado constam de 133 nomes de moradores de Pernambuco entre senhores de engenho, clero, milícia e agricultores.

O governador Geral do Brasil, Antônio Teles da Silva enviava reforços da Bahia.

"Há um ponto muito importante a acentuar: é que a revolta contra o domínio holandês teve a justificativa religiosa, como disse Vieira –'a guerra se fazia pela honra de Deus e defesa da fé católica'". (p. 19, Santiago).  (PEREIRA, 1995) 

Os holandeses passaram a ficar sitiados no Recife, chegando a passar privações. Receberam reforços em 22 de junho de 1646. Animados mandaram cunhar duas moedas comemorativas, as primeiras que se tem notícia no Brasil.

“Reunidas as forças luso-brasileiras, formadas pelos terços de Vieira, André Vidal de Negreiros, os índios de D. Antonio Filipe Camarão, e os negros de Henrique Dias, os luso-brasileiros foram a luta contra as tropas holandesas. Seguiram-se as vitórias dos nossos em Tabocas e Casa Forte respectivamente a 3 e 17 de agosto de 1645, epopeia depois coroada nas duas batalhas dos Montes Guararapes, 1648 e 1649, antecedendo a rendição do Recife em 27 de janeiro de 1654”. (DP, 2003, D5)

Nos anos seguintes os luso-brasileiros continuaram em vantagem e reconquistaram as vilas de Penedo e Porto Calvo, seguida de Itamaracá deixando os holandeses sitiados no Forte Orange. Em 1647 o rei de Portugal envia para Pernambuco Francisco Barreto de Menezes para assumir o comando dos insurretos.

Foram sob o comando de Francisco Barreto que os luso-brasileiros derrotaram as duas tentativas dos holandeses de furar o cerco, encurralados nas duas Batalhas dos Guararapes em 1648 e 1649 respectivamente, piorando muito a situação dos flamengos.

Contribui a colaboração de integrantes da frota anual da Companhia de Comércio do Brasil que chegou ao Recife em 20 de dezembro de 1653, ficando acertado com o comando da guerra que os mesmos fariam o bloqueio da costa do Recife e Olinda. A partir de então foram caindo uma a uma às bases holandesas até a rendição a as 11 horas da noite do dia 26 de janeiro na Campina da Taborda depois de transcorridas 62 horas de negociações. Na mesma noite houve a entrega das chaves da cidade a Barreto de Menezes.

Maquete do Forte das Cinco Pontas exposto no Museu da Cidade do Recife
Foto do acervo particular

Foto do acervo particular

Interior do Forte das Cinco Pontas
Foto do acervo particular

Com a capitulação foi entregues pelos holandeses além das praças do Recife e Maurícia, as de Itamaracá, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará, rendição definida pelo Barão do Rio Branco “como a mais importante que registra a História Militar na América do Sul”.  (SILVA, p. 29)

 HOMENAGENS PÓSTUMAS

Litografia em rótulo de cigarros com os quatro heróis: Vidal de Negreiros, Fernandes Vieira, Henrique Dias e Felipe Camarão. (WIKIPÉDIA)

Em 6 de agosto de 2012, a Lei Federal nº 12.701[7] determinou a inscrição dos nomes de André Vidal de Negreiros, Francisco Barreto de Menezes, João Fernandes Vieira, Henrique Dias, Antônio Filipe Camarão e Antônio Dias Cardoso no Livro de Heróis da Pátria (conhecido como "Livro de Aço"), depositado no Panteão da Pátria e da Liberdade Tancredo Neves, um cenotáfio que homenageia os heróis nacionais localizado na Praça dos Três Poderes, em Brasília(WIKIPÉDIA)


SALÃO GUARARAPES

O Salão Guararapes foi inaugurado em 1997 como um Espaço Cultural na Entrada Principal do Quartel-General do Exército, local de acesso a autoridades civis e militares, nacionais e estrangeiras, em visita à sede do Comando da Força Terrestre do Brasil.


Para tanto, este Salão apresenta diversos elementos representativos da história da Força Terrestre do Brasil, destacando-se o "Tapete Guararapes", o busto do Marechal Luís Alves de Lima e Silva, o Duque de Caxias, o símbolo e o brasão de armas do Exército Brasileiro, a réplica da estátua de Nossa Senhora dos Prazeres, os quadros do artista e historiador militar Coronel Pedro Paulo Cantalice Estigarríbia e a panóplia com as bandeiras históricas do Brasil, dentre outros itens.

TAPETE GUARARAPES

Este tapete, doado pela Fundação Habitacional do Exército para compor a decoração do Salão Guararapes, no Quartel-General do Exército, é uma reprodução da obra do pintor catarinense Victor Meireles, a qual representa um momento épico de nossa História: a Primeira Batalha dos Guararapes, ocorrida em 19 de abril de 1648, nos Montes Guararapes, próximo à cidade de Recife, Pernambuco, considerada o marco de criação do Exército Brasileiro.


Essa Batalha, ocorrida durante a "Insurreição Pernambucana", em 19 de abril de 1648, próximo à cidade de Recife, Pernambuco, é considerada o marco inicial do Exército Brasileiro. Naquela memoriável ocasião, nossas tropas, formadas por patriotas luso-brasileiros, negros e índios, venceram os invasores holandeses, muito superiores em número e armamento, forçando-os, posteriormente, a abandonar o Nordeste brasileiro.

Durante a Insurreição Pernambucana, com o “Compromisso Imortal de Ipojuca”, firmado em 23 de maio de 1645, pela primeira vez em nossa história se registrou o uso da palavra “Pátria” para referir-se a esta terra.

Armando Farias

AMORIM, J. Terto de (Org.). O Siara na rota dos neerlandeses. Utrecht/Fortaleza: Augusto César Barbosa, 2014.
DIÁRIO DE PERNAMBUCO. Os Holandeses em Pernambuco: a civilização do açúcar. Recife, D2, D5, 21 jul.2003.
PEREIRA, Ruy dos Santos. Sobre a invasão holandesa. Jornal do Comércio, 11/6/1995.
SILVA, Leonardo Dantas. Para Entender o Brasil holandês. Revista Continente Documento. Recife: Companhia Editora de Pernambuco, v. 1, n. 1, 2002.

ረቡዕ 20 ጃንዋሪ 2021

O Engenho nos Séculos XVI e XVII

No século XV o açúcar era considerado uma especiaria, porém ao contrário das demais não se resumia a um produto agrícola “e sim o complexo resultado do beneficiamento apropriado da cana de açúcar que tinha de ser plantada, colhida, espremida, cosida, purgada e embalada até se transformar num bem comercializável.” (GOMES, 2006, p, 25). Finalizado existia dois tipos, o açúcar branco e o mascavo de menor valor. 

Segundo Schwartz (1988, p. 21,citado por GOMES, 2006 p 23), “originário das baixadas de Bengala ou do sudoeste asiático, a manufatura do açúcar de cana alcançou a Pérsia e dali foi levada pelos conquistadores árabes à costa ocidental do Mediterrâneo.”

Os portugueses se apropriaram do manejo da cultura da cana e da produção do açúcar e introduziram seu cultivo na Ilha da Madeira, chegando ao final do século XVI como o maior produtor de açúcar do ocidente. 

Foi o seu alto custo nos mercados europeus que propiciou o início da colonização portuguesa no Brasil. Os efeitos civilizadores e religiosos foram uma consequência dessa atividade econômica da qual era um negócio da coroa portuguesa. O epicentro dessa cultura era o engenho que nos séculos XVI e XVII se apresentava em um complexo de edificações demasiado rústicas e em alguns casos de caráter provisório. A chamada casa grande nesse período era construída de taipa e de abode, senzalas também de taipa, com uma única entrada e a “moita” - fábrica, preferencialmente na margem do rio. Em Pernambuco predominou moenda e caldeiras em um cômodo. Purga e encaixotamento em outro edifício, porém próximos. 

Durante as décadas que a Capitania do Siará Grande passou em abandono (1534/1603), Pernambuco e Bahia tinham intensa atividade econômica no plantio e produção de açúcar nos seus engenhos. Porém, pode se depreender que foi uma consequência do franco desenvolvimento desses dois centros que se deu início o processo colonizador da Capitania do Siará Grande, através de correntes migratórias provenientes de Pernambuco e Bahia, a partir do final do século XVII com a distribuição de sesmarias pela Coroa Portuguesa. 

Em 1542, engenhos já haviam sido implantados nas margens do Rio Beberibe, Salvador e Nossa Senhora da Ajuda. Seguiu se expandindo pela Região Nordeste no litoral oriental brasileiro conhecida por de Zona da Mata, que entre Alagoas e Rio Grande do Norte situa-se entre a área litorânea e o Planalto da Borborema. Na Bahia prosperaram na região conhecida por Recôncavo Baiano. Em ambos os casos regiões que ocorre o solo popularmente conhecido por massapê, uma estação chuvosa abundante e uma seca. 

Fixavam-se preferencialmente nos deltas dos rios para facilitar o transporte, onde os barcos levavam o produto finalizando e encaixotado ao porto. Também nesses locais havia abundância de lenha para alimentar as fornalhas que chegavam a queimar por sete a oito meses seguidos.

Moenda de engenho
Moenda de Engenho, vendo-se o sistema de transmissão de força para os cilindros, a partir da roda à água. segundo gravura holandesa do século XVII. Desenho de Frans Post (14,3 x 28,2 cm), do acervo do Museu Real de Belas Artes (Bruxelas). (Souza Leão, F. Post, 1973, n D 21).
Gomes (2006, p. 36)

Havia dois tipos de engenho, o engenho real, movido à água e de grandes proporções, e a engenhoca, movido à tração animal, com menor produtividade e custos mais elevados. A produção de um engenho a roda d'água dobrava em relação aos engenhos movidos a animais. No Ceará, essa nomenclatura (engenhoca) ficou associada a propriedades rurais no século XIX, que produziam aguardente e rapadura. 

No engenho real a produção alcançava 400 pães de açúcar. Eram necessários cerca de 150 a 200 escravos que se dividiam em escravos de enxada e foice para o campo e moenda, e os negros e negras para o serviço da casa. Em outras partes eram necessários vários profissionais para que um engenho de fato produzisse, fabricasse, transportasse e despachasse o açúcar, barqueiros, canoeiros, calafates, carpinteiros com as respectivas madeiras seletas, serrarias de machados e serras, carreiros, oleiros, vaqueiros, pastores e pescadores, um mestre de açúcar, um purgador,  um banqueiro e seu substituto, um contrabanqueiro, um caixeiro no engenho e outro na cidade, feitores e um feitor mor. Necessita ainda o engenho de fornalhas, caldeiras, barcas e carro de junta de bois.

No engenho real a moda de pequena cidadela havia vários edifícios, a casa para o senhor de engenho, quarto separado para hóspede, a capela e morada do capelão, morada dos demais profissionais, as senzalas, casa de purgar, alambique e outras instalações. 

Entre a segunda metade do século VXI e início do século XVII nota-se o crescente número de engenhos em Pernambuco; 23 em 1570 (Gândavo), 66 em 1583 (Cardim) e 77 em 1608 (Campos Moreno). 

A riqueza decorrente da produção e exportação do açúcar foi notada por Gabriel Soares de Sousa (1540/1591) que em seu Tratado Descritivo do Brasil de 1587 sublinha possuir Pernambuco “mais de cem homens que tem até cinco mil cruzados de renda, e alguns até oito mil cruzados.” (DP, 2003, D5)

Graças às vultosas exportações do açúcar de Pernambuco foi possível incrementar a colonização da Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará e a incorporação do Maranhão ao Brasil, fato que se deve ao olindense Jerônimo de Albuquerque, depois acrescido “Maranhão” ao nome tornando-se o primeiro capitão-mor da Capitania do Maranhão em 1615. (DP, 2003)

No século XVIII surgiu o ciclo do ouro, que coexistiu ao do açúcar que não se encerrou, pelo contrário, teve na primeira década do século XVIII um aumento no número de engenhos. Foi nesse século que alcançou a maior e mais rica produção arquitetural de Pernambuco e da Bahia. O que houve foi uma perca no mercado internacional, passando o Brasil a competir com a produção de açúcar do Haiti. O ouro, mesmo no seu auge não ultrapassou a renda proveniente do açúcar, que foi sempre superior a de qualquer outro produto. “quando as exportações totais do Brasil foram avaliadas em 4,8 mil contos de réis, o açúcar respondeu por 50% desse total e o ouro por 46%.” (SCHWARTZ, 1988, p. 169, citado por GOMES, 2006, p.26)

Armando Farias

DIÁRIO DE PERNAMBUCO. Os Holandeses em Pernambuco: a civilização do açúcar. Recife, D4, D5, D6, 21 jul.2003.
ANDRADE, Manoel Correia de. Pernambuco imortal: nativos e colonizadores 1. Recife: Jornal do Comércio, s.d. 
GOMES, Geraldo. Engenho e arquitetura. Recife: Fundaj, Ed. Massangana, 2006.

ቅዳሜ 16 ጃንዋሪ 2021

O Dia do Ceará

Nos séculos XVIII e XIX a economia da Capitania do Sairá era predominantemente a indústria pastoril. Os rebanhos eram transportados por estradas aos grandes mercados, feiras de Pernambuco e da Bahia. O principal ator era o boiadeiro, o vaqueiro e o tangerino. Das praças consumidoras vinham instrumentos, panos e escravos. Essa modalidade de comércio causava diversos prejuízos por conta da longa jornada. A solução foi a comercialização do produto semi-industrializado na forma de mantas conservadas pelo sal. Com a grande aceitação do produto surgiu a venda através da navegação de cabotagem, assim as reses eram transportadas por menores distâncias, somente até os portos a serem carneadas. Os mais importantes eram os da embocadura do Rio Jaguaribe, Acaraú e Coreaú. 

Pintura de vaqueiro no sertão
Imagem do acervo particular

Até o final do século XVIII a Capitania do Siará continuava subordinada a Pernambuco. Sujeição que muito prejudicava o desenvolvimento local principalmente no tocante ao comércio com o Reino, que era obrigatório ser feito através de Pernambuco por intermédio do porto do Recife. 
 
Nesse período parte do comércio era constituído por gêneros da agricultura. A consequência desse processo de “baldeação” era a pequena margem de lucro que os produtores cearenses alcançavam visto que tinham que despender somas significativas com o frete até Pernambuco e para Portugal, encarecendo também ao consumidor final. Outro fator que inibia esse comércio era os naufrágios, que anualmente eram frequentes atribuídos a imperícia dos práticos. Esses altos custos também prejudicavam as trocas dos produtos locais com os importados, que alcançavam cifras elevadas e eram necessários no dia a dia da colônia. 

Tais fatores prejudicavam o desenvolvimento da Capitania do Siará, desestimulando um incremento na produção local. Foram muitos os clamores por parte dos cearenses e demais habitantes radicados na capitania ao Reino de Portugal com objetivo de pôr fim a essa condição. 

Porém nem todos perdiam. Os atravessadores tiravam vultosos lucros como verdadeiros especuladores sobre a situação. 

Essas demandas também enfrentaram a negativa dos Governadores de Pernambuco, que por motivos óbvios não queriam perder suas receitas advindas dos produtos do Siará e não queriam abrir mão dos domínios de uma jurisdição que compreendia mais de mil e duzentas léguas quadradas. Mesmo após o Decreto Real havia tentativas contrárias, chegando ao ponto de tentar burlar a medida régia. “Insistiam na velha prática de mandar por terra os seus cavalos e bois as feiras pernambucanas, fazendo voltar por via marítima artigos e panos para suas lojas.” (GIRÃO, 1959, p. 96)

A solução veio através do Decreto assinado pela Rainha Dona Maria I com data de 17 de janeiro de 1799 ordenando a separação. 

“Considerando os inconvenientes que se seguem, tanto ao meu Real serviço como ao bem dos povos, da inteira dependência em que os governos e as capitanias do Siará e da Paraíba se acham do Governador Geral da Capitania de Pernambuco, que pela distância em que reside não pode dar com prontidão as providências necessárias para a melhor economia interior daquelas capitanias.” (GIRÃO, 1959, p. 93)

“Em tudo que diz respeito a proposta de oficiais militares, nomeações interinas de oficiais e outros atos do governo”. Excluindo “defesa interior das três capitanias e a policia exterior interior das mesmas.”  (GIRÃO, 1959, p. 93)

E acrescentou “Igualmente determino que do Siará e da Paraíba se possa fazer um comércio direto com o Reino, para o que se estabelecerão, em tempo e luar convenientes, as bases da arrecadação que forem precisas e se darão as outras providencias, que a experiência mostra, para a comunicação imediata e o comercio da dita capitania com esse Reino.” (GIRÃO, 1959, p. 95)

De pronto foi nomeado Bernardo Manuel de Vasconcelos para o cargo de Governador da Capitania do Siará. Embarcou no comboy que tinha por comandante o chefe de esquadra Paulo José da Silva Gama, no dia 23 de maio de 1779. Decorridos quase três meses de navegação, chegou ao porto de Pernambuco no dia 11 de agosto, onde se demorou por trinta e nove dias, tempo necessário para preparar as embarcações que deveriam comboiar demais empregados e gêneros e pretextos da Real Fazenda. 

Em 25 de setembro, desembarcou no Porto de Mucuripe e em 29 do mesmo mês tomou posse do Governo. Bernardo de Vasconcelos demonstrou seu comprometimento ao novo cargo pondo-se ao par das necessidades da capitania que iria administrar, cercando-se de pessoas que nela já haviam habitado, destacando-se pelo elevado grau de instrução. Francisco Bento Maria Targine, que o encontrou ainda no Recife e tornou-se seu verdadeiro mentor. 

Bernardo de Vasconcelos mostrou-se deveras empenhado em dar cabo às ordens de Dona Maria I, bem como efetuou diversas benfeitorias na capital abrindo estradas para ligá-la ao interior, estimulando a produção de arroz, proibindo a devastação das matas e preservação da madeira de lei. Nesse período houve um incremento na construção de casas na capital, se deu a instalação da Junta da Fazenda em 1 de outubro de 1799, e das baterias levantadas no Mucuripe com o nome de Forte de São Bernardo. 

Bernardo de Vasconcelos faleceu no exercício das funções em 10 de março de 1802, não chegando portanto a ver a entrada do primeiro navio proveniente da Europa, fato que ocorreu em 10 de março de 1803, quando aportou no Mucuripe a Escuna “Flor do Mar”. 

De imediato, substituiu Bernardo Vasconcelos uma Junta Provisória. Deu continuidade ao seu trabalho o novo Governador nomeado João Carlos Augusto de Oeynhausen, militar ilustre e homem de Estado, aqui chegando em 11 de novembro de 1803. Foi durante a sua gestão que saiu do porto do Aracati o primeiro carregamento de algodão transportado pelo navio “Cobra”. Oeynhausen regularizou definitivamente o comércio entre o Siará e o Reino, livrando-se da incômoda obrigação de fazê-lo por Pernambuco. 

Não se pode deixar de mencionar o nome do rico português Antonio José Moreira Gomes, pioneiro empreendedor que desde 1777 estabeleceu-se em Fortaleza e foi grande incentivador e financiador do plantio de algodão, produto que após 1808 passou a comerciar também com a Inglaterra.

Armando Farias

GIRÃO, Raimundo. Geografia estética de Fortaleza. Fortaleza: Imprensa Universitária do Ceará, 1959.
GIRÃO, Raimundo. Pequena história do Ceará. 2. ed. Fortaleza: Editora Instituto do Ceará, 1962.

እሑድ 10 ጃንዋሪ 2021

Antecedentes da Invasão Holandesa. O Açúcar. Primeiras Tentativas

Na Capitania do Siará são escassos os documentos que abordam o período que antecedeu o domínio Holandês. Há relatos de neerlandês comerciando com indígenas já no início do século XVII. Dos Países Baixos para o Brasil no período entre 1600 e 1630 eram embarcados vários itens, sendo o machado o principal. Facas, facões e canivetes eram transportados em grande quantidade e em menor escala foices, pás e enchós. 

Um artigo particular era o berimbau de boca, chamado de tromp que era um instrumento musical popular na Europa medieval e tornava-se popular entre os índios.

Berimbau
Berimbau
Amorim (2014, p. 31)

O Siará entrou na rota dos neerlandeses por conter em sua costa vários pontos que serviam de referencial e auxílio a marinheiros e cartógrafos para a navegação no Atlântico, como serras, serrotes, cabos e pontas. Outro fator é que entre o Forte dos Reis Magos e a Ilha de São Luis só existia essa fortificação. 

Mapa da região compreendida entre o Rio Grande do Norte e o Piauí
Mapa da região compreendida entre o Rio Grande do Norte e o Piauí
Amorim (2014, p. 44)

Reijnier Pietersz visitou o Siará em 1630 e descreveu um assentamento de 12 casas com um castelinho cercado de paliçadas. Os produtos locais eram algodão, peles, madeira nobre, pedras, e outros. 

Martim Soares Moreno por vezes repeliu ataques de invasores. Em 1625 Moreno impediu que barcos flamengos aportassem no Ceará. Teve ajuda do soldado Manuel Álvares da Cunha bem como de indígenas aliados. Quando Martin Soares Moreno deixou o Siará em 1631 os holandeses já haviam dominado e se instalado em parte da Capitania de Pernambuco. Com a saída de Moreno entra a frágil fortificação de São Sebastião em franca ruína. Recebe seu pequeno continente, cerca de 20 soldados a recomendação de migrar para o Maranhão, considerando estarem suas vidas em perigo. Uma carta de Jácome de Noronha, Capitão Mor da Capitania do Maranhão datada de 1637 informa ao Rei que há dois anos não enviava quaisquer mantimentos ao Siará. Também indica que não havia padre para atender aos soldados. 

Na Bahia os governos de Tomé de Sousa e Mem de Sá inauguraram o início da atividade açucareira. Nos anos de 1560 já estavam instalados e em funcionamento engenhos ao redor de Salvador. Gabriel Soares de Sousa, em 1587, em seu Tratado descritivo do Brasil escreve que o Recôncavo possuía 36 engenhos com uma produtividade de 1.750 toneladas de açúcar. 

Na Bahia, em 1624, uma armada comandada pelos Almirantes Jacob Willeken e Piet Henry, financiada pela Companhia das Índias Ocidentais ataca Salvador. O ataque teve êxito, alguns erros administrativos e militares como a demora no envio de reforços fazem com que essa primeira base seja perdida em 1625 diante de tropas enviadas por Pernambuco e de um reforço armado enviado pela Espanha, que derrota e expulsa os holandeses em 1º de maio daquele ano. 

Em Pernambuco, a cana de açúcar já era cultivada desde o tempo da feitoria de Cristovão Jaques que ficava às margens do Canal de Itamaracá. Essa atividade já era recorrente em 1526 como comprova documentos da Alfândega de Lisboa com pagamentos de direitos sobre o açúcar proveniente de Pernambuco. Informações reveladas por F. A. Varnhagen. 1 

Alegoria dos produtos de Pernambuco em gravura em cobre
Alegoria dos produtos de Pernambuco em gravura em cobre
Diário de Pernambuco (jul. 2003, F. 5)


A Capitania de Pernambuco foi doação feita por Dom João III a Duarte Coelho Pereira em 10 de março de 1534, e compreendia extensa área territorial. Na observação de F. A. Varnhagen a capitania possuía doze mil léguas quadradas, a maior entre todas. Visionário e empreendedor, Duarte Coelho veio disposto a fixar-se em seus domínios. Trouxe a família, parentes do norte de Portugal, aprimoradas técnicas de fabrico do açúcar com a vinda dos engenhos e dos mestres especializados da Ilha da Madeira e capital de financiamento judeu. 

Mapa da costa do Brasil com a divisão das Capitanias Hereditárias, até o estreito de Magalhães
Mapa da costa do Brasil com a divisão das Capitanias Hereditárias, até o estreito de Magalhães (c1572)
Diário de Pernambuco (jul. 2003, D. 4)

Duarte Coelho chega a Pernambuco em 12 de março de 1535 e, após fazer reconhecimento de área, escolhe uma colina à beira mar para implantação de sua cidade. No documento Foral de Olinda de 12 de março 1537 Duarte Coelho enumera suas realizações e menciona pela primeira vez o Arrecife dos Navios, porto da vila que daria origem a cidade do Recife. 

Situação de Olinda, Recife e terras de engenhos das cercanias.
Situação de Olinda, Recife e terras de engenhos das cercanias. Livro que dá Razão no Estado \do Brasil (1616)
Diário de Pernambuco (jul. 2003, D. 4)


Logo o primeiro engenho de Pernambuco foi instalado. Denominado de Engenho Velho de Beberibe foi erguido por Jerônimo de Albuquerque, cunhado de Coelho. Diante do fértil massapé e condições pluviométricas favoráveis às culturas da cana, rapidamente se multiplicarão. Em 1583 um total de 66 engenhos já produzia açúcar. Frei Vicente de Salvador (c. 1564/c. 1636/39) informa que no início do século XVII a situação econômica da capitania era das melhores, o porto mais frequentado do Brasil e uma renda de vinte mil cruzados. Com o aumento da produção, o açúcar passa de item de luxo a produto acessível a todas as classes. Nos museus do Recife encontra-se uma peça chamada polvilhador de açúcar, demonstrando que a princípio seu uso era racional. 

Cana-de-açúcar, aquarela de Smalkalden
Cana-de-açúcar, aquarela de Smalkalden
Diário de Pernambuco (jul. 2003, D.2)


Outra evidência da grande produção de açúcar em Pernambuco e Bahia eram os ataques piratas a navios com carregamento procedentes desses portos. K. R. Andrews informa que entre 1589 a 1591 Portugal perdeu para corsários ingleses 34 navios. Fontes jesuíticas indicam que em 1589 foram capturados por ingleses e franceses 73 navios carregados. 

Esses ataques levaram os portugueses a adotar um outro tipo de embarcação. Trocaram as frágeis caravelas por um grande e pesado navio de origem alemã chamado urca (em alemão e holandês hulk). Entre 1595 e 1605 saíram do porto do Recife 34 deles carregados. 

Toda essa riqueza proporcionou a Olinda um desenvolvimento social, religioso e urbano com “bons edifícios e famosos templos”. Instalaram-se os Padres da Companhia de Jesus (1551) com sua respectiva igreja e colégio, os Padres de São Francisco da Ordem Capucha de Santo Antônio com seu convento e igreja (1585), o Mosteiro dos Carmelitas e sua igreja (1588) e o Mosteiro de São Bento (1592) com seus religiosos e respectivo templo. Além da igreja do Salvador do Mundo, uma das primeiras paróquias do Brasil. 

Como se depreende foi o açúcar o suporte econômico a fomentar os primórdios de desenvolvimento do que seria o Nordeste do Brasil. No caso da Capitania do Siará a consequência foi a introdução da criação de gado para abastecer de carne os centros produtores de cana de açúcar, atividade que impulsionou o povoamento e economia cearense.

Armando Farias

AMORIM, J. Terto de (Org.). O Siara na rota dos neerlandeses.Utrecht/Fortaleza: Augusto César Barbosa, 2014.
DIÁRIO DE PERNANBUCO. Os Holandeses em Pernambuco: uma história de 24 anos, Recife, jul. 2003.



ረቡዕ 30 ዲሴምበር 2020

De capitania subalterna a um dos estados mais promissores da região

Como já mencionado, após a criação do sistema de capitanias para assegurar a posse portuguesa sobre o Brasil, a Capitania do Siará Grande permaneceu em relativo abandono até o início do século XVII (1603). 

Parte desse desinteresse deu-se ao fato que o solo da chamada “costa Leste-Oeste” mostrava-se impróprio para a indústria açucareira, que movia a economia desse período. Contudo a costa cearense era visitada por flibusteiros à procura de recursos extrativistas, que propiciavam um lucro rápido no comércio europeu. Um maior continente e uma maior frequência de franceses nas imediações do litoral, levou Pernambuco a crer na existência de minerais na região. Esse fato motivou a vinda da primeira expedição exploradora chefiada por Pero Coelho de Sousa, que, para tanto, recebera o título de Capitão Mor. 

Encontrava-se o território que compreende o atual Ceará habitado por tribos indígenas de diversas denominações. Estavam os vales cobertos por vegetação arbórea tais como o oitizeiro, jatobá e cedro. Nas áreas mais secas e tabuleiros encontrava-se em abundância, pau ferro, mulungus, jenipapeiros e cajueiros; nas várzeas, o carnaubal. Rios e lagoas também abundavam, visto que nas proximidades do litoral havia maior volume de chuvas. 

A princípio a capitania do Siará Grande ficou vinculada ao Estado do Grão Pará e Maranhão, que eram administrativamente separados do Estado do Brasil. Isso se deu por conta das correntes oceânicas que propiciavam maior facilidade na comunicação de São Luis e Belém direto com Portugal. Posteriormente, a capitania do Siará foi transferida para a administração do Estado do Brasil, passando à condição de capitania subalterna aos governadores de Pernambuco. 

Por Jhonatan Gomes Diniz - Obra do próprio, CC BY-SA 4.0. 
Disponível em: https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=94840275

Como se pode depreender, todo o contexto histórico do que hoje é o Nordeste se encontra interligado. Ao longo da exposição dos fatos históricos pode-se discorrer sobre o fato de alguns estados da região estarem menos desenvolvidos que outros, e mais ainda, os que estão em melhor situação deveriam estar equiparados aos mais desenvolvidos. 

No caso específico do Ceará contamos ao longo dos séculos com a paixão e dedicação de homens e mulheres que através de suas mais variadas atuações alçaram uma inexpressiva capitania, que mais se assemelhava a um entreposto militar ao promissor Estado do Ceará.

Armando Farias